Proposta de Lei N. º53/XIV
Exposição de Motivos
Na senda do Programa Capitalizar, a reforma legislativa introduzida no processo de insolvência e nos processos judiciais e extrajudiciais de recuperação de empresas e pessoas singulares encontra-se, neste momento, consolidada.
Criou-se um instrumento próprio de reestruturação de dívida para as pessoas singulares – Processo Especial para Acordo de Pagamento (PEAP) –; bem como um novo mecanismo extrajudicial de recuperação para as empresas – Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE). Por outro lado, credibilizou-se o Processo Especial de Revitalização (PER), impedindo que empresas insolventes possam recorrer ao mesmo, tendo sido introduzidas alterações no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas que otimizaram os seus institutos.
Ora, na sequência da emergência de saúde pública internacional, muitos Estados-Membros da União Europeia, entre os quais Portugal, declararam o estado de emergência nacional, que determinou o necessário confinamento dos cidadãos e, consequentemente, a paralisação de um conjunto vário de atividades, criando para os agentes económicos uma situação de constrangimento financeiro fundado na falta de liquidez, que tem impedido o cumprimento de obrigações vencidas.
A crise económica que se vivencia deverá, oportunamente, ser objeto de reflexão nos trabalhos de transposição da Diretiva (UE) 2019/1023 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, sobre os regimes de reestruturação preventiva, o perdão de dívidas e as inibições, e sobre as medidas destinadas a aumentar a eficiência dos processos relativos à reestruturação, à insolvência e ao perdão de dívidas, e que altera a Diretiva (UE) 2017/1132 (Diretiva sobre reestruturação e insolvência), mas não deve impor uma transposição acelerada e pouco ponderada desta ou, sequer, alterações apressadas ao Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, apenas devido às consequências da pandemia da doença COVID-19.
Não obstante, tendo em vista dotar os instrumentos judiciais de recuperação vigentes de mecanismos de adaptação à pandemia da doença COVID-19, introduz-se a possibilidade de, no âmbito do PER e do PEAP, o juiz poder conceder um prazo suplementar para conclusão das negociações encetadas com vista à aprovação de plano de recuperação ou de acordo de pagamento adaptado ao contexto da COVID-19, bem como conceder prazo ao proponente de plano de insolvência para adaptação da proposta a esse mesmo contexto.
Por outro lado, conforme preconizado no Programa de Estabilização Económica e Social, o Governo propõe a criação ex novo de um mecanismo temporário, de natureza extraordinária, destinado, exclusivamente, a empresas que se encontrem em situação económica difícil ou de insolvência, iminente ou atual, em virtude da pandemia da doença COVID-19, e que sejam viáveis: um processo extraordinário de viabilização de empresas.
Para tanto estabelece-se como pressuposto que a empresa, a 31 de dezembro de 2019, demonstrasse um ativo maior que o passivo, sendo a incapacidade de cumprir obrigações vencidas resultado da crise causada pela pandemia da doença COVID-19, exigência essa que se justifica, tendo em conta a experiência passada vivida em Portugal.
Com efeito, não pode ser ignorado o elevado número de empresas que, não sendo efetivamente suscetíveis de recuperação, recorreram de forma abusiva ao PER, entre 2012
e 2017, apenas para atrasar a sua declaração de insolvência, prejudicando, assim, o regular
funcionamento da economia, causando prejuízo ao Estado, trabalhadores e demais credores.
O processo extraordinário de viabilização de empresas ora proposto visa a homologação de um acordo de reestruturação de dívida estabelecido extrajudicialmente entre a empresa e os seus credores.
A fim de garantir que seja tramitado de forma particularmente célere, além do encurtamento dos prazos e da supressão da fase da reclamação de créditos, atribui-se prioridade a este processo extraordinário sobre os demais processos também urgentes (processos de insolvência, PER e PEAP).
Sem prejuízo do princípio geral da intangibilidade dos créditos tributários e da Segurança Social, que se mantém intocado, no contexto do processo extraordinário de viabilização de empresas, prevê-se expressamente a possibilidade de redução da taxa de juros de mora, no âmbito de acordo homologado conducente à consolidação financeira da empresa.
Noutro conspecto, a fim de assegurar a coerência entre os mecanismos de reestruturação de empresas e de promover a viabilização através de mecanismos extrajudiciais alarga-se o âmbito de aplicação do RERE a empresas que se encontrem em situação de insolvência atual em virtude da pandemia da doença COVID-19.
Por último, é essencial que o Estado, que tem à sua guarda importantes somas de dinheiro no âmbito de processos judiciais de insolvência, permita que estas possam ser, no mais curto prazo possível, distribuídas aos credores, injetando liquidez na economia.
De facto, não obstante o artigo 178.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas prever já a possibilidade de o administrador da insolvência apresentar um plano e mapa de rateio parcial que entenda dever ser efetuado, certo é que tal nem sempre ocorre.
Nessa medida, em conformidade com o propugnado no Programa de Estabilização Económica e Social propõe-se a obrigatoriedade da realização de rateios parciais em todos os processos de insolvência pendentes em que haja produto de liquidação igual ou superior a € 10 000,00, cuja titularidade não seja controvertida.
No sentido de possibilitar, igualmente e com urgência, a injeção de liquidez na economia mais se prevê a atribuição de prioridade na tramitação de requerimentos de liberação de cauções ou garantias prestadas no âmbito de processo de insolvência, processo especial de revitalização ou processo especial para acordo de pagamento.
Assim:
Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei:
a) Estabelece um regime excecional e temporário de prorrogação do prazo para conclusão das negociações encetadas com vista à aprovação de plano de recuperação ou de acordo de pagamento, bem como de concessão de prazo para adaptação da proposta de plano de insolvência, no âmbito da pandemia da doença COVID-19;
b) Prevê a aplicação do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE) a empresas que se encontrem em situação de insolvência atual em virtude da pandemia da doença COVID-19;
c)Cria um processo extraordinário de viabilização de empresas, afetadas pela crise económica decorrente da pandemia da doença COVID-19;
d) Estabelece a obrigatoriedade da realização de rateios parciais em todos os processos de insolvência pendentes em que haja produto de liquidação depositado num valor acima de € 10 000,00;
e)Prevê a atribuição de prioridade na tramitação de requerimentos de liberação de cauções ou garantias prestadas no âmbito de processo de insolvência, processo especial de revitalização ou processo especial para acordo de pagamento.
Artigo 2.º
Plano de recuperação e acordo de pagamento em negociação
A requerimento fundamentado da empresa ou do devedor, consoante os casos, e do administrador judicial provisório, o juiz pode conceder nova prorrogação do prazo para conclusão das negociações encetadas com vista à aprovação de plano de recuperação ou do acordo de pagamento adaptados ao contexto da pandemia da doença COVID-19, por uma só vez e por um mês, além da prevista no n.º 5 do artigo 17.º-D e no n.º 5 do artigo 222.º- D do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, na sua redação atual.
Artigo 3.º
Plano de insolvência
Na assembleia de credores para apreciação e votação de plano de insolvência a que se refere o n.º 1 do artigo 209.º do CIRE, mediante requerimento fundamentado do proponente do mesmo, o juiz pode conceder um prazo de até 15 dias úteis para adaptação da proposta ao contexto da pandemia da doença COVID-19.
Artigo 4.º
Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas
A empresa devedora que, comprovadamente, se encontre em situação de insolvência atual em virtude da pandemia da doença COVID-19, mas que ainda seja suscetível de viabilização, e que, de acordo com as normas contabilísticas aplicáveis conjugadas com o previsto no n.º 3 do artigo 3.º do CIRE, demonstre ter, em 31 de dezembro de 2019, um ativo superior ao passivo, pode submeter ao RERE, aprovado pela Lei n.º 8/2018, de 2 de março, as negociações e os acordos de reestruturação que alcance com um ou mais dos seus credores.
Artigo 5.º
Finalidade e natureza do processo extraordinário de viabilização de empresas
1 - O processo extraordinário de viabilização de empresas destina-se à empresa que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente ou atual, em virtude da pandemia da doença COVID-19, mas que ainda seja suscetível de viabilização.
2 - Para efeitos da presente lei, é considerada empresa toda a organização de capital e trabalho destinada ao exercício de qualquer atividade económica, independentemente da natureza jurídica do seu titular.
3 - O processo referido no n.º 1 pode ser utilizado por qualquer empresa que, não tendo pendente processo especial de revitalização ou processo especial para acordo de pagamento à data da apresentação do requerimento, reúna as condições necessárias para a sua viabilização e que, de acordo com as normas contabilísticas aplicáveis conjugadas com o previsto no n.º 3 do artigo 3.º do CIRE, demonstre ter, em 31 de dezembro de 2019, um ativo superior ao passivo.
4 - Em derrogação do número anterior, o processo referido no n.º 1 pode ser utilizado por qualquer micro ou pequena empresa, na aceção do anexo ao Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro, na sua redação atual, que não tivesse, em 31 de dezembro de 2019, um ativo superior ao passivo, desde que:
a) Não tenha pendente processo de insolvência, processo especial de revitalização ou processo especial para acordo de pagamento à data da apresentação do requerimento referido no n.º 1 do artigo seguinte;
b) Tenha recebido um auxílio de emergência no âmbito do quadro temporário relativo a medidas de auxílio estatal em apoio da economia no atual contexto da pandemia da doença COVID-19 e o mesmo não tenha sido reembolsado nos termos legais; ou
c)Esteja abrangida por um plano de reestruturação ao abrigo das regras em matéria de auxílios estatais.
5 - O processo extraordinário de viabilização de empresas tem caráter urgente, assumindo prioridade sobre a tramitação e julgamento de processo de insolvência, de processo especial de revitalização e de processo especial para acordo de pagamento.
6 - Ao processo extraordinário de viabilização de empresas aplica-se o disposto no CIRE, nas disposições que não sejam incompatíveis com a sua natureza, e, subsidiariamente, as disposições gerais do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, na sua redação atual, em tudo o que não contrarie as disposições da presente lei.
7 - Não podem submeter-se ao processo extraordinário de viabilização de empresas as entidades referidas no n.º 2 do artigo 2.º do CIRE.
Artigo 6.º
Fase liminar
1 - O processo extraordinário de viabilização de empresas inicia-se pela apresentação pela empresa, no tribunal competente para declarar a sua insolvência, de requerimento acompanhado dos seguintes elementos:
a) Declaração escrita e assinada pelo órgão de administração da empresa, que ateste que a situação em que se encontra é devida à pandemia da doença COVID-19 e que reúne as condições necessárias para a sua viabilização, sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo anterior;
b) Cópia dos documentos a que aludem as alíneas b) a i) do n.º 1 do artigo 24.º do CIRE;
c)Relação por ordem alfabética de todos os credores, incluindo condicionais, com indicação dos respetivos domicílios, dos montantes dos seus créditos, datas de vencimento, natureza e garantias de que beneficiem, e da eventual existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º do CIRE, subscrita e datada, há não mais de 30 dias, pelo órgão de administração da empresa e por contabilista certificado ou por revisor oficial de contas, sempre que a revisão de contas seja legalmente exigida;
d) Acordo de viabilização, assinado pela empresa e por credores que representem pelo menos as maiorias de votos previstas no n.º 5 do artigo 17.º-F do CIRE.
2 - Com a apresentação referida no número anterior a empresa pode requerer a apensação de processo extraordinário de viabilização, intentado por sociedades comerciais com as
quais a empresa se encontre em relação de domínio ou de grupo, nos termos do Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de setembro, na sua redação atual, quando este, encontrando-se igualmente na fase liminar, tenha sido instaurado ao abrigo do presente regime.
3 - Recebidos os documentos referidos no n.º 1, o juiz nomeia de imediato, por despacho, o administrador judicial provisório indicado pela empresa, aplicando-se o disposto nos artigos 32.º a 34.º do CIRE com as necessárias adaptações, devendo a secretaria publicar no portal Citius a relação de credores aludida na alínea c) do n.º 1 e o acordo de viabilização.
4 - O despacho referido no número anterior é de imediato notificado à empresa, sendo lhe aplicável o disposto nos artigos 37.º e 38.º do CIRE com as devidas adaptações.
5 - Na falta de indicação de administrador judicial provisório pela empresa o juiz procede à sua nomeação, por sorteio.
6 - Logo que tome conhecimento da sua nomeação, o administrador judicial provisório deve informar a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), o Instituto da Segurança Social, I. P., e o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I. P., da pendência do processo extraordinário de viabilização, identificando a empresa requerente, comprovando tal ato nos autos.
7 - A remuneração do administrador judicial provisório é fixada pelo juiz na sentença, entre € 300,00 e € 3 000,00, considerando a natureza e âmbito do acordo, a dimensão da empresa, designadamente o seu volume de negócios, número de trabalhadores e especificidades da área de atividade em que se encontre inserida.
Artigo 7.º
Efeitos
1 - A decisão a que se refere o n.º 3 do artigo anterior:
a) Obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra a empresa e, até ao trânsito em julgado da sentença de homologação ou não homologação, suspende, quanto à empresa, as ações em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja homologado o acordo de viabilização, salvo quando este preveja a sua continuação ou quando os créditos em causa naquelas ações não estejam abrangidos pelo acordo;
b) Impede a empresa de praticar atos de especial relevo, tal como definidos no artigo 161.º do CIRE, sem que previamente obtenha autorização para a realização da operação pretendida por parte do administrador judicial provisório.
2 - A autorização a que se refere a alínea b) do número anterior deve ser requerida por escrito pela empresa ao administrador judicial provisório e concedida pela mesma forma, no prazo de cinco dias.
3 - Para efeitos do disposto no número anterior, a empresa e o administrador judicial provisório devem recorrer, sempre que possível, a comunicações eletrónicas.
4 - A falta de resposta do administrador judicial provisório ao pedido formulado pela empresa corresponde a declaração de recusa de autorização para a realização do negócio pretendido.
5 - Os processos de insolvência em que anteriormente haja sido requerida a insolvência da empresa suspendem-se na data de publicação no portal Citius do despacho a que se refere o n.º 3 do artigo anterior desde que não tenha sido proferida sentença declaratória da insolvência, extinguindo-se logo que seja homologado o acordo de viabilização.
6 - Os processos de insolvência em que seja requerida a insolvência da empresa entrados depois da publicação no portal Citius do despacho a que se refere o n.º 3 do artigo
anterior suspendem-se.
7 - A decisão a que se refere o n.º 3 do artigo anterior determina a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pela empresa até à prolação da sentença de homologação ou de não homologação.
8 - A partir da decisão a que se refere o n.º 3 do artigo anterior e até à prolação da sentença de homologação ou de não homologação, não pode ser suspensa a prestação dos seguintes serviços públicos essenciais:
a) Serviço de fornecimento de água;
b) Serviço de fornecimento de energia elétrica;
c)Serviço de fornecimento de gás natural e gases de petróleo liquefeitos canalizados;
d) Serviço de comunicações eletrónicas;
e)Serviços postais;
f) Serviço de recolha e tratamento de águas residuais;
g) Serviços de gestão de resíduos sólidos urbanos.
Artigo 8.º
Tramitação
1 - Qualquer credor dispõe do prazo de 15 dias, contados da publicação no portal Citius da relação de credores, para, junto do tribunal competente, proceder à sua impugnação, com fundamento na indevida inclusão ou exclusão de créditos ou na incorreção do montante ou da qualificação dos créditos reconhecidos, e solicitar a não homologação do acordo de viabilização, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 215.º e 216.º do CIRE, com as devidas adaptações.
2 - Não é aplicável ao prazo referido no número anterior o disposto no n.º 5 do artigo 139.º do Código de Processo Civil.
3 - No prazo referido no n.º 1, o administrador judicial provisório emite parecer sobre se o acordo oferece perspetivas razoáveis de garantir a viabilidade da empresa.
4 - O juiz dispõe do prazo de 10 dias para:
a) Decidir sobre as impugnações formuladas, com base na prova documental carreada para os autos, devendo em caso de procedência das mesmas ordenar a alteração da relação de credores em conformidade;
b) Analisar o acordo, considerando as pronúncias dos credores e o parecer do administrador judicial provisório, devendo homologá-lo, por sentença, se este, cumulativamente:
i) Respeitar as maiorias previstas no n.º 5 do artigo 17.º-F do CIRE;
ii) Apresentar perspetivas razoáveis de garantir a viabilidade da empresa;
iii) Não subsistir alguma das circunstâncias previstas nos artigos 215.º e 216.º do CIRE.
5 - A decisão sobre as impugnações não é autonomamente recorrível.
6 - Não sendo impugnada, a relação de credores converte-se de imediato em definitiva.
7 - Convertendo-se a relação de credores em definitiva, o juiz procede, no prazo de 10 dias, à análise do acordo, devendo homologá-lo, por sentença, se o acordo satisfizer o previsto na alínea b) do n.º 4.
8 - No cômputo das maiorias previstas no n.º 5 do artigo 17.º-F do CIRE confere-se aos créditos sob condição a percentagem de 50 % de direitos de voto correspondentes aos créditos relacionados.
9 - A decisão de homologação vincula a empresa, os credores subscritores do acordo e os credores constantes da relação de credores, mesmo que não hajam participado na negociação extrajudicial, relativamente aos créditos constituídos à data em que foi proferida a decisão prevista no n.º 3 do artigo 6.º, e é notificada, publicitada no portal Citius e registada pela secretaria do tribunal.
10 - O recurso da decisão de homologação ou não homologação sobe imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo.
11 - A não homologação acarreta o encerramento do processo de viabilização e a extinção de todos os seus efeitos, sendo inaplicável o disposto nos artigos 17.º-G e 222.º-G do CIRE.
12 - Compete à empresa suportar as custas do processo, incluindo a remuneração do administrador judicial provisório.
13 - Para efeitos processuais, o valor da causa é de € 30 000,01.
14 - É aplicável ao acordo de viabilização o disposto no n.º 1 do artigo 218.º do CIRE.
15 - O termo do processo extraordinário de viabilização impede a empresa de recorrer novamente ao mesmo.
Artigo 9.º
Fase de adesão
1 - Qualquer credor que não conste da relação de credores definitiva dispõe do prazo de 30 dias, contados da publicitação no portal Citius da decisão de homologação do acordo de viabilização, para, no processo, por mera declaração, manifestar a sua intenção de aderir ao acordo homologado.
2 - Decorrido o prazo a que alude o número anterior, a empresa é notificada das declarações dos credores, devendo, no prazo de cinco dias, informar se aceita a adesão daqueles ao acordo.
3 - A adesão ao acordo dos credores, que mereça a concordância da empresa, vincula-os ao mesmo nos termos do disposto no n.º 9 do artigo anterior, sem necessidade da intervenção do juiz.
4 - O silêncio da empresa equivale à recusa da adesão dos credores.
Artigo 10.º
Garantias
1 - As garantias convencionadas entre a empresa e os seus credores no âmbito do processo extraordinário de viabilização, com a finalidade de proporcionar àquela os necessários meios financeiros para o desenvolvimento da sua atividade, mantêm-se mesmo que, findo o processo, venha a ser declarada, no prazo de dois anos, a sua insolvência.
2 - Os credores, sócios, acionistas ou quaisquer outras pessoas especialmente relacionadas com o devedor que, no âmbito do processo extraordinário de viabilização, financiem a atividade da empresa disponibilizando-lhe capital para a sua viabilização gozam de privilégio creditório mobiliário geral, graduado antes do privilégio creditório mobiliário geral concedido aos trabalhadores, nos termos do n.º 2 do artigo 17.º-H do CIRE.
Artigo 11.º
Resolução em benefício da massa insolvente
1 - Caso a empresa venha a ser ulteriormente declarada insolvente, são insuscetíveis de resolução em benefício da massa insolvente os negócios jurídicos que hajam compreendido a efetiva disponibilização à empresa de novos créditos pecuniários, incluindo sob a forma de diferimento de pagamento, e a constituição, por esta, de garantias respeitantes a tais créditos pecuniários, desde que os negócios jurídicos hajam sido expressamente previstos no acordo de viabilização.
2 - O disposto no número anterior não é aplicável se o novo financiamento tiver sido utilizado pela empresa em benefício da respetiva entidade financiadora ou de entidade que com esta esteja especialmente relacionada, nos termos referidos no artigo 49.º do CIRE.
Artigo 12.º
Créditos tributários e da Segurança Social
1 - Para efeitos de acordo a homologar relativamente aos créditos da AT e da Segurança Social aplica-se o seguinte regime:
a) Artigos 196.º e 199.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de outubro, na sua redação atual, relativamente aos créditos da AT;
b) Artigos 13.º e 14.º do Decreto-Lei n.º 42/2001, de 9 de fevereiro, e os n.ºs 13 e 14 do artigo 199.º do Código de Procedimento e Processo Tributário, quanto aos créditos da Segurança Social.
2 - Os créditos tributários e da Segurança Social são indisponíveis, só podendo existir redução da taxa de juros de mora, no âmbito de acordo homologado conducente à consolidação financeira da empresa, nos termos descritos no número seguinte.
3 - Às prestações calculadas nos termos do n.º 1 são aplicáveis reduções da taxa de juros de mora, que não são cumuláveis com as demais reduções previstas noutros diplomas, nos seguintes montantes:
a) 25 % em planos prestacionais de 73 até 150 prestações mensais;
b) 50 % em planos prestacionais de 37 e até 72 prestações mensais;
c) 75 % em planos prestacionais até 36 prestações mensais;
d) Totalidade de juros de mora vencidos, desde que a dívida se mostre paga nos 30 dias seguintes à homologação do acordo.
4 - Os pagamentos das prestações calculadas nos termos do n.º 1 são imputados, em primeiro lugar, ao capital em dívida, seguindo-se os juros compensatórios, os juros de mora e os encargos, sucessivamente.
5 - Em caso de incumprimento do acordo homologado, fica sem efeito a redução da taxa de juros de mora prevista no n.º 3, sendo aplicável o regime previsto no n.º 1 do artigo 200.º do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Artigo 13.º
Efeitos fiscais
1 - A homologação do acordo de viabilização confere às partes subscritoras os benefícios previstos nos artigos 268.º a 270.º do CIRE, desde que compreenda a reestruturação de créditos correspondentes a, pelo menos, 30 % do total do passivo não subordinado da empresa.
2 - A AT pode, por requerimento fundamentado apresentado por alguma das partes abrangidas pelo acordo de viabilização, aceitar que o mesmo produza os efeitos previstos no número anterior, ainda que este não abranja a percentagem do passivo aí referido.
3 - Para efeitos do disposto no n.º 1, o acordo de viabilização é acompanhado de declaração, redigida em língua portuguesa, emitida por revisor oficial de contas, certificando que o acordo de viabilização compreende a reestruturação de créditos correspondentes a, pelo menos, 30 % do total do passivo não subordinado do devedor e que, em virtude do acordo de viabilização, a situação financeira da empresa fica mais equilibrada, nomeadamente por aumento da proporção do ativo sobre o passivo, e os capitais próprios da empresa são superiores ao capital social.
4 - Para efeitos do disposto no n.º 12 do artigo 52.º do Código do IRC, presume-se que o acordo de viabilização que as partes decidam submeter a processo extraordinário de viabilização de empresas e que cumpra o disposto nos números anteriores, reveste reconhecido interesse económico.
5 - Os créditos incobráveis podem ser diretamente considerados gastos ou perdas do período de tributação, ainda que o respetivo reconhecimento contabilístico já tenha ocorrido em períodos de tributação anteriores, desde que não tenha sido admitida perda por imparidade ou esta se mostre insuficiente em processo extraordinário de viabilização, quando for homologado acordo de viabilização que cumpra com o disposto no n.º 3 e do qual resulte o não pagamento definitivo do crédito.
Artigo 14.º
Rateios parciais
1 - Em todos os processos de insolvência pendentes à data da entrada em vigor da presente lei é obrigatória a realização de rateios parciais das quantias depositadas à ordem da massa insolvente, desde que, cumulativamente:
a) Já tenha transitado em julgado a sentença declaratória da insolvência e o processo tenha prosseguido para liquidação do ativo pela forma prevista nos artigos 156.º e seguintes do CIRE;
b) Já se tenha esgotado o prazo de impugnação da relação de credores previsto no artigo 129.º do CIRE, sem que nenhuma impugnação tenha sido deduzida, ou, tendo-o sido, se a impugnação em causa já estiver decidida, seja nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 131.º do CIRE, seja por decisão judicial, aplicando-se o disposto no n.º 1 do artigo 180.º do CIRE caso a decisão não seja definitiva;
c)As quantias depositadas à ordem da massa insolvente sejam iguais ou superiores a € 10 000,00 e a respetiva titularidade não seja controvertida.
2 - O administrador da insolvência elabora o mapa de rateio referido no número anterior, sendo o mesmo imediatamente publicado pela secretaria no portal Citius, dispondo a comissão de credores, caso tenha sido nomeada, e os credores, de 15 dias, contados desde a data da publicação, para se pronunciarem sobre o mapa de rateio.
3 - Findo o prazo referido no número anterior, caso não seja deduzida oposição fundamentada, nem o juiz manifeste, em 10 dias, a sua discordância com o mesmo, o mapa de rateio torna-se definitivo, devendo o administrador da insolvência proceder, de imediato, ao pagamento aos credores, acautelando o pagamento integral das dívidas da massa insolvente e com respeito pelo previsto nos artigos 180.º e 181.º do CIRE.
4 - Caso seja, no prazo previsto no número anterior, deduzida oposição fundamentada pela comissão de credores, por qualquer credor ou manifestada discordância pelo juiz, cabe a este decidir os pagamentos que considere justificados.
Artigo 15.º
Liberação de cauções e garantias
Os requerimentos de liberação de cauções ou garantias prestadas no âmbito de processo de insolvência, processo especial de revitalização e processo especial para acordo de pagamento, apresentados em processos novos e nos que estejam pendentes à data da entrada em vigor da presente lei, assumem prioridade sobre os demais requerimentos apresentados no âmbito desses processos.
Artigo 16.º
Entrada em vigor e vigência
1 - A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação e vigora até 31 de dezembro de 2021.
2 - A vigência do regime do processo extraordinário de viabilização de empresas instituído pela presente lei pode ser alargada por Decreto-Lei.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 16 de julho de 2020
O Primeiro-Ministro
A Ministra da Justiça
O Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares
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